PERIGO AMBIENTAL
No país, a idade média dos gasedutos, oleodutos e polidutos é de 16 anos, embora em São Paulo e Bahia existam 183 quilômetros de tubulações com mais de 40 anos. Para estudiosos, nível de segurança é muito inferior ao de países desenvolvidos
Cristina Ávila Da equipe do Correio
O Brasil tem 20 mil quilômetros de extensão de gasedutos, oleodutos e polidutos - ou seja, tubulações que transportam petróleo bruto para as 11 refinarias da Petrobras no país e o produto final para pontos de distribuição. Esses canos estão sob os pés dos brasileiros, passam por baixo de escolas, igrejas, campos de futebol. Em Brasília, obras do Setor Complementar de Indústria e Abastecimento (SCIA) estão suspensas porque tratores estavam concretando o local onde passa um duto, ameaçando a população da invasão da Estrutural de ser atingida por uma explosão. Os acidentes não deixam dúvidas sobre os riscos. Na opinião do Coordenador dos Programas de Pós-graduação de Engenharia da Universidade do Rio de Janeiro (Coppe/UFRJ), Segen Estefen, as causas fundamentais começam pela falta de iniciativa do próprio governo federal. ‘‘Há muito o que fazer para alcançar o nível de segurança dos países desenvolvidos. Temos técnicos competentes na área de engenharia no Brasil, mas falta ter um diagnóstico da situação atual e estabelecer metas. Não existem políticas claras de exigência para proteção ambiental’’, afirma. Após o vazamento de 1,3 milhão de litros de óleo na Baía de Guanabara, em janeiro, a Coppe/UFRJ divulgou um laudo acusando a Petrobras de negligência porque as especificações do projeto original do duto não foram cumpridas. Estefen diz que o Coppe/UFRJ tem uma proposta - ‘‘em fase de assinatura para daqui poucas semanas’’ - entre a Agência Nacional de Petróleo e o Banco Mundial, para se implementar um sistema de monitoramento de vazamentos por meio de imagens de satélites. ‘‘Poderemos identificar manchas de óleo no mar e saber sua origem. Isso vai auxiliar estudos para encaminhamento de ações preventivas’’, conta ele. Para o diretor de controle ambiental da Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente (Feema, do Rio de Janeiro) o acidente na Baía da Guanabara em janeiro pode ser explicada pela conjunção de dutos antigos com sistema de controle pouco eficientes. Ele diz que no local há trechos de dutos com 40 anos. Essas tubulações atravessam o Brasil. Um poliduto de 985 quilômetros transporta combustíveis de Paulínia para Brasília. Por baixo de parte da invasão da Estrutural passam, por hora, um milhão de litros de gasolina, óleo diesel e querosene de aviação, durante 13 dias por mês. Mas o engenheiro João Carlos Bretas, da Petrobras, garante que o sistema é moderno (começou a operar em 1997), controlado por computadores. Bretas afirma que os riscos eram as escavações que estavam sendo feitas por empresas que compraram lotes no SCIA. As obras foram suspensas por ordem da Secretaria de Segurança. Amanhã, haverá uma reunião com representantes da Petrobras e GDF para decidir ações conjuntas. A Defesa Civil considerou que havia riscos de explosão, próximo à invasão, onde vivem 1.500 famílias. Segundo o gerente de Tecnologia de Dutos e Terminais da Petrobras, Marcelino Guedes Gomes, no país a idade média é de 16 anos, embora em São Paulo e Bahia existam 183 quilômetros de tubulações com 41 a 45 anos. São sete dutos antigos dos 1.040 que atravessam o país. Entre os 20 mil quilômetros da malha brasileira, 15 mil são responsabilidade exclusiva da empresa. A Petrobras Transporte Ltda (Transpetro, empresa que faz parte da holding) é responsável por 75%. Ou seja, 10 mil quilômetros de extensão. Os outros 5 mil são do Departamento de Exploração e Produção da Petrobras. Além disso, tem 3.150 quilômetros explorados por outra subsidiária - a Gaspetro - que opera no transporte de gás da Bolívia para o Brasil. Outros 2 mil quilômetros são operados por várias empresas petroquímicas e distribuidoras. Segundo o secretário geral do Sindicato dos Petroleiros do Paraná e de Santa Catarina, Pedro Teodoro Rocha, o duto onde houve o acidente no mês passado no Paraná tem 25 anos. Embora reconheça que a população sofra ameaças, Marcelino Gomes diz que é um risco tolerável. ‘‘Quem embarca em um Boeing 767 sabe que ele sobe, mas não sabe se ele desce.’’ Segundo Gomes, existe tecnologia que reabilita tubulações antigas - o que ele diz estar acontecendo nos velhos dutos de São Paulo e Bahia. Ainda ressalta que são feitos testes a cada três anos com um equipamento chamado pig instrumentado, cilindro que passa por dentro dos dutos, medindo sua espessura, identificando riscos de vazamentos.
SEGURANÇA NORTE-AMERICANA O site Seattle P-I.com, de artigos especiais, traz um alerta sobre os riscos nos Estados Unidos, assinado por Scott Sunde. Segundo ele, o país tem 251 mil quilômetros de dutos por onde são transportados gasolina e outros combustíveis líquidos. Sunde diz que nos acidentes ocorridos nos últimos anos, geralmente as causas mais freqüentes foram corrosão não detectada, inspeções impróprias e falhas nas iniciativas que devem ser tomadas imediatamente após a constatação dos problemas. ‘‘Nos anos 90, os maiores acidentes somaram 21 milhões de litros a cada ano’’, afirma. ‘‘Temos um sistema com 30 a 40 anos de idade, precariamente operado e sem programa regular para prevenção de sua deteriorização’’, ressalta. O governo federal é responsável pelo programa de segurança dos dutos. Os princípios de segurança estão calçados no modelo de construção, em testes operacionais, manutenção e tipo de respostas disponíveis às emergências. Eles têm inventário sobre toda a estrutura existente no país, análise de incidentes e até sobre a habilidade das indústrias em avaliar problemas no sistema de operações e sugerir novas tecnologias para evitar incidentes ou reduzir prejuízos quando são inevitáveis.
Vazamentos
18 de janeiro de 2000
O rompimento de um duto que liga a Refinaria Duque de Caxias ao terminal da Ilha d’Água provocou o vazamento de 1,3 milhão de óleo combustível na Baía de Guanabara. A mancha se espalhou por 40 quilômetros quadrados. Laudo da Coordenadoria de Programas de Pós-Graduação em Engenharia (Coppe/UFRJ), divulgado em 30 de março, concluiu que o derrame de óleo foi causado por negligência da Petrobras, já que as especificações do projeto original do duto não foram cumpridas. Na ocasião, o diretor Antônio Luiz Menezes reconheceu que ‘‘desde a primeira hora que todo o acidente foi provocado pela própria empresa.’’
11 de março
Cerca de 18 mil litros de óleo cru vazaram em Tramandaí, no litoral gaúcho, quando eram transferidos de um navio petroleiro para o Terminal Almirante Soares Dutra (Tedut), da Petrobras, na cidade. O acidente foi causado pelo rompimento de uma conexão de borracha do sistema de transferência de combustível e provocou mancha de cerca de três quilômetros na Praia de Jardim do Éden.
16 de março
O navio Mafra, da Frota Nacional de Petróleo, derramou 7.250 litros de óleo no canal de São Sebastião, litoral norte de São Paulo. O produto transbordou do tanque de reserva de resíduos oleosos, situado no lado esquerdo da popa. A Cetesb multou a Petrobras em R$ 92,7 mil.
26 de junho
Nova mancha de óleo de um quilômetro de extensão apareceu próximo à Ilha d’Água, na Baía de Guanabara. Desta vez, 380 litros foram lançados ao mar pelo navio Cantagalo, que presta serviços à Petrobras. O despejo ocorreu numa manobra para deslastreamento da embarcação.
16 de julho
Quatro milhões de litros de óleo foram despejados nos rios Barigüi e Iguaçu, no Paraná, por causa de uma ruptura da junta de expansão de uma tubulação da Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar). O acidente levou duas horas para ser detectado, tornando-se o maior desastre ambiental provocado pela Petrobras em 25 anos.
29 de julho
Cerca de mil litros de MTBE (metil terc-butil éter), aditivo da gasolina altamente tóxico, vazou durante 25 horas, contaminando o solo em Paracambi, na Baixada Fluminense, no Rio. O duto era de ferro fundido e tinha um furo de um milímetro.
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